Revista de Liturgia Ediçã 181 – Façam isto…

No ritual judaico da páscoa, durante a ceia, celebrada em família, o filho mais novo pergunta ao Pai: “Por que esta noite é diferente das outras?” E o pai responde, relatando ao filho a história do êxodo, ampliando pela narração (hagadá), o sentido que o próprio rito expressa.

Esta é a tradição que recebemos do novo testamento. Quando lemos os relatos da última Ceia de Jesus, seja nos sinóticos, seja em Paulo (cf.1Cor 11,23-25), temos aí um conjunto – ação ritual e sua compreensão teológica – formando uma unidade inseparável. A transmissão e a vivência do sentido se dá mediante o relato do rito.

Durante o primeiro milênio da Igreja essa tradição foi mantida. O teólogo não é alguém que faz discurso sobre Deus, mas é, antes de tudo, alguém que celebra e participa na própria vida do Espírito e do Filho, e é desta experiência litúrgica que emergem palavras que esclarecem e animam a fé na comunidade dos que crêem em Jesus. A liturgia é, então, fonte de teologia e de espiritualidade.

No segundo milênio houve o conhecido divórcio entre teologia e espiritualidade (devoção) e entre liturgia e teologia. Sem teologia a liturgia ficou reduzida a rubricas e sem liturgia a teologia se tornou excessivamente racional.

O Movimento Litúrgico, que culminou no Concílio Vaticano II, propôs o retorno à unidade perdida, uniu de novo prática celebrativa e teologia, afirmou ser a liturgia de natureza teológica, libertando-a do rubricismo e dando-lhe o lugar de primeira e mais necessária fonte de espiritualidade (SC 14). A reforma litúrgica do Concílio Vaticano II é uma reforma de caráter teológico. Os ritos, retornando às fontes da Tradição, são portadores de sentido que em parte é apreendido no ato de celebrar, pela participação ativa do povo e, em parte, deve ser explicitado pela catequese.

Não podemos mais pensar a formação litúrgica e a catequese sem levar em conta os ritos e o seu sentido, expresso no ato de celebrar. O Centro de Liturgia da Faculdade Nossa Senhora da Assunção, em São Paulo, tem insistido sobre a importância da formação litúrgica a partir da ação ritual. Nossa Revista, tem seguido este método e, ao longo deste ano, está trazendo uma compreensão dos sacramentos, a partir dos gestos fundamentais de cada um deles. Nesta primeira edição o assunto é eucaristia, sua transmissão na catequese e na formação teológica.