A II Conferência do Episcopado Latino-americano, ocorrida em Medellín, há 50 anos, buscou fazer uma recepção criativa e contextualizada do Concilio Vaticano II no continente latinoamericano e caribenho. Não bastava simplesmente implantar o Concílio; era imprescindível traduzi-lo como resposta às grandes questões do nosso continente, marcado pelo grave fenômeno da pobreza que atingia grande parte do povo.
O Concílio inaugurou um novo modelo de Igreja, povo de Deus, superando a compreensão de uma instituição centrada em si mesma e identificada como clero. Neste novo paradigma, os fiéis fazem parte da Igreja, graças ao Batismo que estabelece uma igualdade fundamental entre leigos e clero, ainda que haja diversidade de serviços e ministérios. O sujeito eclesial, dessa forma, deixa de ser apenas o clero e passa a ser toda a comunidade e, nesse sentido, participante da vida do Cristo, sacerdote, profeta e rei, a serviço do seu reino no mundo.
Aqui na América Latina, após Medellín, essa Igreja povo de Deus, assumindo fisionomia própria, conquistou o necessário protagonismo para pensar e agir, à luz do Evangelho, passando a dizer uma palavra sua, com identidade, e não necessariamente repetindo o que vem de Roma. Mantendo, assim, a comunhão com a Igreja universal, mas agindo localmente,
com zelo e responsabilidade pastoral.
Medellín se propôs desenvolver uma ação evangelizadora que atingisse as camadas mais populares e também as instâncias de poder, com o fim de promover uma libertação integral: espiritual e corporal, pessoal e coletiva.Essa opção implicaria grandes conflitos dentro e fora da Igreja. Foram tempos difíceis, de enfrentamento e de perseguição por parte dos poderes constituídos e pelos donos do dinheiro. Milhares de pessoas deram a vida por causa da justiça, em nome do Deus de Jesus e do seu Evangelho.
Dom Oscar Romero, bispo de El Salvador, foi alvejado durante uma celebração eucarística porque pedia aos militares o cessar fogo contra o povo salvadorenho, pobre e indefeso. Fazia esse pedido em nome de Deus e da sua fé, não por qualquer interesse político ou ideologia. Agora, 38 anos depois, o seu martírio é reconhecido, o que se deve ao papa Francisco, que tem decididamente trabalhado para chamar de volta o espírito de Medellín.
Com a conferência de Aparecida e, sobretudo, com a escolha de Francisco na condução da Igreja, respiramos ares novos, apesar dos movimentos claramente contrários que se avolumam em seu interior. O caminho aberto por Medellín, na continuidade do Concilio Vaticano II, seguirá o seu curso, sob o dinamismo do Espírito e com a ousadia dos que se deixarem guiar por Ele.
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