O Concílio Vaticano II chegou à América Latina pelas portas da II Conferência Geral do Episcopado Latino Americano em Medellín (1968). Eram tempos difíceis em nosso continente, mas também tempo de grande esperança que anunciava um futuro de transformação e de desenvolvimento. O documento final de Medellín deixou registrado na introdução o pensamento da Igreja na voz dos seus pastores naquele momento histórico: “Assim como o povo de Israel sentia a presença de Deus na travessia do mar em direção à terra da liberdade, o novo povo de Deus que habita este chão não poderia deixar de sentir o seu passo que salva quando se dá a passagem de situações menos humanas para situações mais humanas. Tratava-se de uma atualização histórica daquilo que no Vaticano II foi o ponto central que provocou as grandes mudanças na Igreja do século XX: a consciência do mistério pascal no coração da história.
Sendo a liturgia memorial da páscoa, a celebração litúrgica comporta e coroa um compromisso com a realidade humana, com o desenvolvimento e com a promoção e deve manter-se numa situação dinâmica que acompanhe tudo o que houver de são no processo de evolução da humanidade para conduzir a uma experiência vital da união entre a fé, a liturgia e a vida cotidiana, em virtude da qual chegue o cristão ao testemunho de Cristo (cf. Capítulo 9).
Neste contexto, as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) emergiram e se fortaleceram como um novo jeito de ser Igreja, que faz do engajamento social expressão de fé, e compreende a liturgia como sacramento da fé vivida na luta de cada dia. Os grandes Encontros Intereclesiais de CEBs, desde o primeiro em Vitória do Espírito Santo em 1975, até o 13º em janeiro de 2013 no Juazeiro do padre Cícero (CE), expressando o que se vive no cotidiano das comunidades, são demonstração de uma liturgia com pé no chão, movida por um olhar atento à Palavra da bíblia e à mesma Palavra presente na história.
De Medellín para cá muita coisa mudou e as próprias CEBs, combatidas por grupos reacionários dentro e fora da Igreja, sentiram ameaçada a sua força profética. Contudo, a sua herança está viva: resistentes sementes dentro das comunidades e nos diversos grupos que se organizam para não deixar a profecia morrer. Prova disso são os encontros de fé e política ou as juventudes organizadas em pastoral, em rede, em grupos de vivência, e tantos outros grupos eclesiais.
O I Encontro Nacional de Juventudes e Espiritualidade Libertadora, acontecido em Fortaleza no início de maio de 2014, foi uma experiência de espiritualidade libertadora nos moldes das CEBs, sobretudo as celebrações, nas quais eram explícitas a fé e a união com Deus vividas nos movimentos sociais; ao mesmo tempo, em diálogo com novas gerações, com suas experiências diversificadas, às vezes não expressamente social e política, mas nem por isso menos significativas e autênticas. Afinal, a espiritualidade é dom de Deus, fruto do Espírito, que sopra onde quer. Fundamental é não permitir que nossas celebrações, até as mais cotidianas, sejam mera formalidade, mas expressem a fé que professamos, fé enraizada e ecumênica, comprometida com as grandes causas e feita experiência sapiencial no cotidiano da vida.
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