Neste Advento de 2023, a Revista de Liturgia chega à edição de número 300, completando 50 anos de serviço à renovação da
Igreja no Brasil. De fato, a constituição litúrgica, por ser o primeiro documento promulgado, já no final da 2ª sessão da reunião conciliar, começa anunciando a finalidade do Concílio Vaticano II, fazendo-a soar como uma urgência: promover a vida cristã (SC 1). A Igreja estava tão distanciada de suas raízes evangélicas que era necessário um concílio para reconectá-la com as fontes, tanto da sua fé – a Liturgia, as Escrituras, a Tradição –, como da sua missão de anunciar o Reino de Deus.
Mas como renovar a Igreja sem devolver ao povo de Deus o acesso à sua revelação, que fora ocultada por séculos sob o véu do latim e de cerimônias, as quais haviam se tornado complexas na sua forma, linguagem e compreensão? Sendo a liturgia a lex orandi, isto é, a norma orante da fé, primeira e mais genuína teologia da Igreja, que tem nela sua mais perfeita manifestação, ela não poderia permanecer aprisionada por uma expressão ritual inacessível e, tampouco, ficar obscurecida por adereços incompatíveis com a nobre simplicidade romana. É na liturgia, “cuja eficácia nenhuma outra ação da Igreja iguala” (SC 7), que Deus se revela a seu povo, e é também nela que Ele escuta, nos cantos e nas orações, a sua prece de ação de graças e de súplica. Eis porque foram tão naturais e determinantes as decisões de abandonar o latim e de ordenar os ritos, apresentando estes últimos de tal maneira que eles exprimissem mais claramente o seu sentido, a fim de que o povo, por uma participação plena e ativa (cf. SC 21), pudesse melhor compreendê-los.
Desse modo, reformada a partir do Concílio, a liturgia resgata um entendimento da celebração como corpo de Cristo, constituído na comunidade reunida em seu nome, e como lugar da nossa orientação ao Pai “por Cristo, com Cristo e em Cristo”. Nela recebemos o sopro do Espírito que vivifica a Igreja e que nos transfigura à imagem do Filho amado. Nesse sentido, muito significativo tem sido celebrar o jubileu da nossa Revista juntamente com os 60 anos da constituição litúrgica, o que tem permitido abordar o significado dessas comemorações sob diversos ângulos, ao longo deste ano.
A recepção da reforma da liturgia continua tendo, na Constituição Sacrosanctum Concilium, que a gerou, a sua pedra de sustentação. Mas ela tem recebido novos impulsos. Um deles, com a Carta Apostólica Desiderio Desideravi, publicada pelo papa Francisco em 2022, com a qual a constituição litúrgica foi praticamente “relançada”. E, outro, com o caminho sinodal que tem conduzido a Igreja. A sinodalidade, cabe notar, mais do que um princípio a produzir eventos ocasionais, é um modo de ser eclesial que requer permanente escuta do Espírito. E em nenhum outro lugar a Igreja é mais sinodal do que na sua liturgia, pois, onde tudo se faz comunitariamente, aí o Corpo de Cristo se manifesta, presente na riqueza dos membros reunidos.
Nestes 50 anos da Revista de Liturgia, a Igreja, como nunca deixou de fazer, segue a nos desafiar para o exercício do nosso ministério carismático de Pias Discípulas do Divino Mestre, que Padre Tiago Alberione nos confiou e para o qual nos encorajou a sermos, nela, “membros vivos e operantes”. A ele, a nossa congregação religiosa, a todos e leitores e leitoras e aos articulistas, dedicamos a alegria e a gratidão deste jubileu.
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