Enquanto fechamos esta edição de nossa Revista, estamos acompanhando o sofrimento de milhares de pessoas em Brumadinho, MG, vítimas do tenebroso crime cometido pela mineradora Vale. Um mar de lama inundou a vida de uma cidade e não há nada que possa ser feito para amenizar tamanha dor que grita aos prantos! Como em Belém, quando Herodes mandou matar crianças inocentes: “Ouviu-se uma voz em Ramá, choro e grande lamentação: Raquel chora seus filhos; e não quer consolação porque eles já não existem” (Mateus 2,18).
Mas no meio da imensa tragédia, há anjos de luz (bombeiros, amigos e parentes, vizinhos, voluntários, ativistas), que abrigam a dor, que recolhem o pranto, que se apresentam generosos para trazer de volta os corpos, sem medo de afundar na lama, para que não fiquem insepultos. Eles são sinais, a indicar que no meio das trevas pode brilhar a luz, que há uma presença oculta a transformar a morte em vida. Foi assim que Deus se manifestou ao longo da história, desde Abrão, passando por Moisés e pelos profetas. E ao se encarnar em nossa humanidade frágil, assumiu a morte com todas as suas faces.
Com a Quaresma, nos voltamos ao mistério do Deus que, em Jesus, se fez morte, suportou a mais brutal violência, foi sepultado, num ato de solidariedade extrema com a nossa humanidade ferida e desumanizada. Antes de sermos convocados a abraçar a cruz do Senhor, Ele veio carregar os fardos da humanidade. Em Brumadinho, no entanto, a ganância antecipou a quaresma, Deus se fez lama com os enlameados. Em vez de subida até o Calvário, foi descida até as profundezas das minas, até os lugares mais recônditos onde ninguém pôde chegar.
É deste lugar de morte que caminharemos para a páscoa, evocando a ESPERANÇA que fez os descendentes de Abrão saírem do Egito, que trouxe de volta à sua terra os exilados, que deu resistência à humanidade em tempos de ditaduras e nazismos, que fez a noite ser a única testemunha da Ressurreição de Jesus.
Continuando pelas trilhas indicadas por Medellín, o grande evento eclesial que mudou os rumos da Igreja na América Latina, identificamos em Brumadinho o túmulo do Cristo, o lugar de sua morte-ressurreição, que celebramos na liturgia.
Avaliações
Não há avaliações ainda.